Guaxupé, domingo, 28 de abril de 2024
Marco Regis de Almeida Lima
Marco Regis de Almeida Lima Antena Ligada Marco Regis de Almeida Lima é médico, nascido em Guaxupé, foi prefeito de Muzambinho (1989/92; 2005/08) e deputado estadual-MG (1995/98; 1999/2003). E-mail: marco.regis@hotmail.com

COLÔMBIA DÁ INÉDITA VIRADA PARA A ESQUERDA

quinta-feira, 30 de junho de 2022
COLÔMBIA DÁ INÉDITA VIRADA PARA A ESQUERDA Gustavo Preto venceu a eleição na Colômbia com mais de 50% dos votos no segdo turno (Foto: Jhon Paz/Xinhua)

Pessoas da minha idade detêm na memória as informações de que foi a Colômbia o cenário mais resistente e duradouro das guerrilhas na América do Sul. Talvez um dos mais sangrentos numa história de meio século. Ainda assim, no prevalecimento da veracidade dos acontecimentos devo citar, como fontes do texto que ora discorro, o nexojornal.com.br, a BBC News Brasil de 20/6/2022, a edição de 2014 do Almanaque Abril, o Dicionário Houaiss e maestrovirtuale.com.br/escravidão-na-colombia-historia-e-abolicao.

As décadas de 1960 e 1970 tornaram-se extraordinárias no florescimento de guerrilhas na América do Sul. A expressão vem do espanhol “guerrilla”, ou guerra pequena, “expressão que passou a ser empregada no contexto de resistência da população espanhola contra a invasão napoleônica de 1800/10” como transcrevo do “site’: https://mundoeducacao.uol.com.br > historiageral > guerra-de-guerrilha. No meu entendimento, as principais causas dessa multiplicação guerrilheira foram: a bipolaridade e a tensão mundial da Guerra Fria, do qual o Vietnã foi a mais explosiva manifestação; pela resistência às inumeráveis ditaduras instaladas no continente; por motivação ideológica; e pelos próprios exemplos de que movimento dessa natureza derrubou a Ditadura de Fulgêncio Batista, em Cuba, ou que resistiu com táticas de ocultação e mobilidade as forças armadas norte-americanas, pondo em retirada as tropas dos Estados Unidos da América – EUA – do solo vietnamita, num conflito que durou de 1959 a 1975.  Citamos o Vietnã nessa categoria, embora a disputa tenha sido tratado como Guerra do Vietnã, porque os EUA, na verdade, sempre consideraram suas invasões ou intromissões belicosas como guerras legítimas, ao contrário do que pensam hoje sobre a Ucrânia.

Os Golpes de Estado militares aconteceram com frequência na América Latina no século passado, demonstrando a fragilidade democrática de países em fase de consolidação. Todavia, em pesquisa pela Wikipedia sobre os períodos de governo na República da Colômbia, instalada em 1886, observamos que a alternância de poder, através de eleições, teve maior regularidade do que, por exemplo, em países como Argentina e Brasil, havendo um único golpe militar quando o General Rojas Pinilla assumiu o poder entre 1953/57, entregando-o a uma Junta Militar ao finaldesse período, que pavimentou o restabelecimento democrático em menos de um ano, propiciando que um acordo entre Conservadores e Liberais se alternassem no governo de 1958 a 1974.

Entretanto, era inegável o fosso que separava os camponeses das elites colombianas. A colonização espanhola exterminou as populações indígenas nos seus primeiros cem anos. Fez do porto de Cartagena um dos maiores pontos de desembarque de negros africanos escravizados, que tinham destinação local, Equador, Venezuela e Panamá. Essa mão de obra desumana foi utilizada na mineração e na agricultura da cana-de-açúcar, do café, da banana, do tabaco e do algodão. Ao final da escravidão, em meados do século XIX, os cativos libertos foram relegados à própria sorte na área rural. Hoje, os afrodescendentes representam em torno de 10,3 % da população colombiana.

Através da ideologia, em defesa da Reforma Agrária, despontaram em 1964 as FARC – Fuerzas Armadas Revolucionárias de Colômbia – autoproclamada como marxistas-leninistas. A simpatia popular inicial pelas FARC foi considerável. Entretanto, o movimento foi perdendo apoio com o passar dos anos, porque sua atuação para a desestabilização dos governos envolvia atentados terroristas, sequestros para a obtenção de recursos para a sua subsistência, além de, mais tarde, suposto envolvimento com o tráfico de cocaína. Depois das FARC, surgiram o também marxista ELN – Ejército de Liberación Nacional –  e o M-19 – Movimiento 19 de abril, em alusão à data da sua fundação em 1974, não marxista, cujo ideário focava o nacionalismo, a democracia e a justiça social, de atuação predominantemente urbana. Seu líder era Carlos Pizarro, que viria a ser assassinado durante os futuros processos de negociação entre o governo e as guerrilhas com vistas à deposição das armas e a integração delas à Política Tradicional. Num primeiro momento fracassou o acordo com os movimentos marxistas, sendo aquele com a adesão das FARC somente assinado em 2016, no governo de Juan Manuel Santos, ex-Ministro da Defesa de Álvaro Uribe.

Todavia, o M-19, se integrou à União Patriótica, em 1985, nela conseguindo a proeza de eleger 19 deputados constituintes à Assembleia Nacional, em 1991. Todavia, mais de 3.000 militantes do M-19 foram assassinados por narcotraficantes, paramilitares e militares governistas, durante esse processo, dentre eles o próprio líder Pizarro. Segundo dados colhidos na edição de 2014, do Almanaque Abril, no auge desses confrontos com as guerrilhas, sobressaíam as forças paramilitares do AUC – Autodefesas Unidas da Colômbia – formadas por milícias organizadas de proprietários rurais. A Direita colombiana viria a se unir à AUC, todos orbitando em torno da influência do Presidente Álvaro Uribe, que obteve a aprovação da reeleição no Parlamento e governou de 2002/10, sempre de mãos dadas com os EUA.

As recentes eleições colombianas levaram a Esquerda pela primeira vez ao governo do País. O vitorioso foi Gustavo Petro, candidato pela coligação denominada Pacto Histórico. No 1º turno ele obteve 40% dos votos contra 28% do milionário Direitista e Populista, Rodolfo Hernández, e 24 % da Direita Tradicional, de Uribe, Federico “Fico” Gutiérrez. No 2º turno: Petro com 50,44% e Hernández com 47,34%. Um triunfo por apertada margem de 3,1%, que obrigará Petro a manter sua linha política equilibrada, que demonstrou como Vereador na sua cidadezinha natal, Deputado, Prefeito de Bogotá e Senador. Ele terá de lidar com o desemprego e com as relações com os EUA, para quem seu país sempre disse amém, mantendo Acordo de Livre Comércio e dando livre trânsito militar do Tio Sam em bases pela Colômbia.

Petro, 62 anos, é economista, mas, rotulado de guerrilheiro durante toda a campanha eleitoral. Sua vice é uma ativista ambiental e advogada, Francia Márquez, a primeira mulher negra a galgar esse cargo. Na verdade, quando o M-19 foi fundado Petro tinha apenas 10 anos, tendo adentrado na militância nos anos 1980, havendo ficado preso durante dois anos por porte ilegal de arma de fogo entre 1985/87. Este período prisional o exime de determinadas ações violentas do M-19, principalmente da famosa e trágica tomada do Palácio da Justiça, em 1985, ocasião em que morreram 100 pessoas, dentre eles guerrilheiros, reféns civis e magistrados, incluindo o então Presidente do STF da Colômbia, ficando 11 pessoas misteriosa e suspeitosamente desaparecidas. A ação durou 28 horas, com a feitura de reféns. Houve uma imediata reação do Exército que chegou a invadir o prédio com tanques de guerra, sem ordens aparentes do Presidente Belisário Betancur. Na série Narcos, da Netflix, há recapitulação desse quadro dramático, por suspeita nunca confirmada que um dos objetivos seria a queima de documentos que protegessem Pablo Escobar, chefe do Cartel de Medellin.

Com a posse de Gustavo Petro e Francia Márquez, em agosto, dos 12 países independentes da América do Sul, 8 estarão alinhados à esquerda e 4 à direita, aqui estando o Brasil (Jair Bolsonaro), Equador (Guillermo Lasso), Paraguai (Mário Benitez Abdo) e Uruguai (Lacalle Pou). Por ordem alfabética, os oito de esquerda são:  Argentina (Alberto Fernández), Bolívia (Luís Arce), Chile (Gabriel Boric), Colômbia (Gustavo Petro), Guiana (Irfan Ali, muçulmano do P.S.), Peru (Pedro Castillo), Suriname (Chan Santokhi) e Venezuela (Nicolás Maduro).

Num mapa atualizado poderíamos colorir 4 países em azul, 1 vermelho (Venezuela) e 7 em rosa, pois defendem posições socialistas democráticas. Em entrevista, que reproduzimos de uma de nossas fontes citadas, o Prof. André Coelho, da disciplina de Ciência Política da UNIRIO, comenta: “Este ainda não é um momento tão favorável à Esquerda como foi a primeira década dos anos 2.000, mas, é um momento da sua reconstrução na região”.      
 
               
 
         
 
         
 

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