Guaxupé, domingo, 28 de abril de 2024
Marco Regis de Almeida Lima
Marco Regis de Almeida Lima Antena Ligada Marco Regis de Almeida Lima é médico, nascido em Guaxupé, foi prefeito de Muzambinho (1989/92; 2005/08) e deputado estadual-MG (1995/98; 1999/2003). E-mail: marco.regis@hotmail.com

A FAIXA DE GAZA VISTA COMO CAMPO DE CONCENTRAÇÃO

quinta-feira, 26 de outubro de 2023
A FAIXA DE GAZA VISTA COMO CAMPO DE CONCENTRAÇÃO Foto: Ashraf Amra/Anadolu via Getty Images

O caro leitor certamente irá associar as imagens de filmes de cinema com um campo de concentração como daqueles que existiram durante a 2ª Guerra Mundial. São grandes extensões prisionais a céu aberto, cercadas por arame farpado, dentro das quais milhares de seres humanos esquálidos e alquebrados executavam tarefas desumanas, sendo vigiados por cães ferozes e impiedosos soldados nazistas empunhando fuzis e pontiagudas baionetas. Milhões foram exterminados nos milhares de campos de concentração nazistas espalhados por doze países da Europa, durante a 2ª Guerra Mundial (1939/45).  A maioria foi de judeus, todavia a teoria da raça pura também exterminou negros, homossexuais, deficientes físicos e deficientes mentais. Para dar vazão ao extermínio, alguns desses campos foram dotados de câmaras de gás, provocando mortes em massa, acelerando e até escondendo a violência atroz que era o fuzilamento das pessoas.

Do portal HISTÓRIA do MUNDO (
www.historiadomundo.com.br) pinçamos textos da matéria Campos de Concentração Nazistas, produzida por Daniel Neves Silva, assim definidos: “São construções militares desenvolvidas com o objetivo de aprisionar pessoas, sendo essas prisioneiras de guerra ou prisioneiras políticas. Os campos de concentração foram utilizados com o objetivo de segregar determinados grupos políticos, classes sociais ou estrangeiros do restante da população. [...]

Ao longo da história da humanidade, existiram campos de concentração em outros países e em outros momentos históricos. Os campos de concentração nazistas, no entanto, foram violentos pelo seu caráter de genocídio dos judeus, reconhecido como o Holocausto. Também foram construídos na África do Sul, durante a Guerra dos Bôeres; Sudoeste Africano Alemão (antiga colônia alemã e atual Namíbia); União Soviética, os ‘gulags’ do período stalinista; Bósnia, durante a
Guerra da Bósnia, construídos por sérvios para aprisionar bósnios muçulmanos”.

Não poderia eu deixar esta listagem que extraio do “site” citado sem aqui incluir outro tipo abominável campo de concentração, que foi o Estádio Nacional de Santiago, no Chile. Nesse tradicional campo de futebol chileno a estimativa é de que tenham passado cerca de 20.000 pessoas presas a partir do dia seguinte da instalação da sanguinária ditadura do General Augusto Pinochet. Seu uso, na realidade foi de 12 de setembro de 1973 até meados de novembro, porquanto a Seleção de Futebol do país andino deveria disputar, nesse estádio, um jogo de futebol contra a União Soviética válido como repescagem para a Copa do Mundo de 1974 na Alemanha. O Chile foi à Copa porque os soviéticos se recusaram a vir a Santiago como forma de protesto contra o Golpe Militar que derrubou o governo socialista e democrático de SALVADOR ALLENDE. O Presidente socialista teria se suicidado ou mesmo morto durante desproporcional bombardeio aéreo ao Palácio de La Moneda. Também nunca deverá ser esquecido que, no embarque do selecionado chileno para a Alemanha, o jogador CARLOS CASZELY, que atuava no futebol espanhol, demonstrou coragem e politização ao se recusar dar as mãos para os cumprimentos do ditador Pinochet, lembrando que sua mãe, militante esquerdista, fora submetida à tortura pelo regime militar. Segundo buscas na imprensa brasileira, a ideia de prender pessoas em campos de futebol ou em navios foi um modelo “tipo exportação”, adotado pela Ditadura Militar brasileira (1964/85), que foi aproveitada em dimensão mais numerosa e cruel pelo facínora chileno Pinochet. No Brasil, foi usado o Estádio de Caio Martins, de Niterói, onde o time do Canto do Rio fazia os seus jogos pelo antigo Estado da Guanabara. “Não só um palco para abuso. Mas um palco onde muitas pessoas estiveram confinadas, presas, sofrendo abusos físicos e psicológicos, diz o professor de História Cláudio Márcio Prado, em entrevista exclusiva à equipe do “site” Aventuras na História, em parceria com o portal SportBuz”.

Continua a matéria de Daniel Neves da Silva no portal História do Mundo: “Os campos de concentração estão presentes na história da Alemanha nazista desde o momento em que Adolf Hitler ascendeu ao poder daquele país em 1933. [...] O primeiro desses campos foi o de Dachau, que recebeu militantes comunistas e social-democratas. Apesar da maioria judaica de prisioneiros, a história dos campos de concentração nazistas está muito relacionada a outros grupos que não eram de judeus. Os primeiros campos nazistas foram designados para receber doentes mentais, deficientes físicos, criminosos etc. Os judeus só começaram a ser enviados para campos de concentração a partir de 1938”. [...]

Assim, foram desenvolvidos seis campos de extermínio, cujo intuito era promover a execução de judeus em larga escala. Os campos eram: Auschwitz, Belzec, Chelmno, Majdanek, Sobibor e Treblinka, todos localizados na Polônia.
Outros campos construídos pelos nazistas são classificados pelos historiadores como campos de trabalho forçado. Nesses locais, os judeus eram colocados para trabalhar e ficavam em instalações de péssima condição. Eram sujeitos a maus-tratos e recebiam uma alimentação muito pobre. Os judeus eram espancados por motivos fúteis, e prisioneiros eram sumariamente executados quando cometiam um ‘delito’ ou mesmo sem cometer nada de errado”.

Historiadores do Holocausto estimam que nos seis campos de extermínio tenham morrido aproximadamente: Auschwitz-Birkenau: 1,2 milhão de pessoas; Treblinka: 800 mil pessoas; Belzec: 600 mil pessoas; Chelmno: 300 mil pessoas; Sobibor: 250 mil pessoas; Majdanek: 80 mil pessoas”.

Precisamos descrever um pouco da Geografia e da História da Palestina e de Israel a fim de que eu possa pincelar o atual panorama de Gaza, que dá título a este artigo. Vamos aqui entremear textos de nossa autoria e os da Professora Paloma Guitarrara, que é Licenciada, Bacharel e Mestre em Geografia pela UNICAMP, em texto publicado em brasilescola.uol.com.br/geografia/palestina.
“A Palestina está localizada no Oriente Médio. Historicamente, os assírios a denominavam de Palastu uma região compreendida entre o que é hoje as cidades de Gaza e Tel Aviv. Ao longo do tempo, esse território foi ocupado por hebreus, filisteus, assírios, babilônios, persas, macedônios, bizantinos (Império Romano do Oriente) e o Império Turco-Otomano, este até o final da 1ª Guerra Mundial.”.

No portal.estrategia.com/materias/historia/qual-a-origem-e-identidade-do-povo-palestino-na-biblia? lê-se: “O nome Palestina, biblicamente, vem do termo “Peléshet”, que é frequente na Bíblia Hebraica, traduzido como “Filistia”. Os hebreus se estabeleceram na Palestina, conhecida na Antiguidade como Canaã, na célebre marcha do Êxodo liderada por Moisés, desde o Egito dos faraós até a Terra Prometida, em que ele não pôde adentrar.  Por outro lado, os filisteus eram um povo proveniente do Mediterrâneo, com origens na Ásia Menor e na Grécia. Eles se estabeleceram na região costeira da Palestina e tinham uma relação conturbada com os hebreus, frequentemente entrando em conflito com eles. [...] No entanto, é possível traçar uma conexão histórica entre hebreus, filisteus e o atual povo palestino”. Em Gênesis 10:14 se aclara que os filisteus descendem de Casluim, filho de CAM, sendo este um dos três filhos de Noé, depois do dilúvio, juntamente com JAFET e SEM, donde também os judeus serem chamados de SEMITAS. 

Entrementes, faz-se necessário neste emaranhado histórico que leiamos o Livro de Gênesis 21:1-21 a fim de que tenhamos uma sucinta compreensão da origem de árabes e israelitas. Na sua velhice, Abraão teve o filho Ismael com sua escrava egípcia Agar e. posteriormente, Isaque com sua mulher Sara. Neste conflito familiar Sara disse a Abraão: (21:10) “Rejeita essa escrava e seu filho, porque o filho dessa escrava não será herdeiro com Isaque, meu filho”. (21:11) Pareceu isso mui penoso aos olhos de Abraão, por causa de seu filho (Ismael)”. (22:12) “Disse, porém, Deus a Abraão: não te pareça isso mal por causa do moço e por causa da tua serva; atende a Sara em tudo o que ela te disser; porque por Isaque será chamada a tua descendência”. (21-13) “Mas também do filho da serva farei uma grande nação, por ser ele seu descendente” (que veio a ser o povo árabe).

Para não pairar dúvidas, aqui reproduzimos parte de um texto da Igreja Batista Nacional Betel intitulado Povo de Deus (ibnbetel.org/noticias/76951/o-que-significa-hebreus-israelitas-e-judeus), esclarecendo que “São nomes dados ao povo de Deus”. Ou seja, aos descendentes de Abraão por seu filho Isaque. Na qual a Bíblia afirma que Deus escolheu o seu povo. Jesus, inclusive, faz parte dos seus descendentes. [...] HEBREU aparece pela primeira vez na Bíblia em Gênesis 14:13, sendo Abraão o pai dos hebreus, que descenderiam de Héber, trineto de Noé. A denominação ISRAELITA advém do personagem do Velho Testamento, Jacó, neto de Abraão e filho de Isaque que, após ter tido um contato com Deus, passou a se chamar Israel, de onde nasceriam descendentes, que formariam as DOZE TRIBOS de ISRAEL, assim chamados de israelitas. O termo judeu aparece pela primeira vez em 2 Reis 16-6, devido à predominância da tribo de Judá, quando voltaram do cativeiro no Egito rumo à Terra Prometida. Logo os termos hebreu, israelita e judeu cumprem o mesmo propósito, mas com diferentes origens”.

Assim, poderemos agora nos deter nas duas porções que formam a atual Palestina. Comecemos pela Faixa de Gaza, que tem uma distância equivalente de Monte Belo a Guaxupé, aqui no Sul de Minas. Aproximadamente 41 km de extensão e 12 km de largura, a Faixa de Gaza é um terreno estreito, pobre e densamente povoado, ocupando área de 565 Km2. Praticamente é cercado pelo Estado de Israel, com quem faz divisas a leste e nordeste, bem como o Mar Mediterrâneo a oeste, que é controlado pela Marinha Israelense. Ao sul e sudoeste, faz divisas com a Península do Sinai / Egito, pais árabe coirmão que lhe é hostil.

Mais do que um enclave, pode-se afirmar que a Faixa de Gaza é uma monumental prisão israelense, um inquestionável campo de concentração a céu aberto, considerando-se as divisas geográficas acima descritas e as restrições e domínio de tudo que entra ou sai por via terrestre, marítima e aérea, sob controle israelense.  A Faixa de Gaza tem 2.106.745 habitantes, de acordo com os dados oficiais de 2021. Esse contingente equivale a, aproximadamente, 40% da população palestina, levando-se em consideração também os territórios na área da Cisjordânia.

A população que vive no território da Faixa de Gaza é muito jovem. As informações oficiais indicam que 41% possuem entre 0 e 14 anos de idade, constituindo, assim, a maior parcela. A faixa que vai dos 15 aos 29 anos concentra 28,2% dos habitantes, ao passo que os idosos, ou seja, aqueles que possuem 60 ou mais, são apenas 4,6% dos moradores. A idade mediana da população da Faixa de Gaza é de 18,3 anos, uma das mais baixas do mundo. São esses jovens as vítimas de Israel.

Assim, a Faixa de Gaza isoladamente não é um país. A Organização das Nações Unidas (ONU), no entanto, reconhece a Palestina desde 2012, quando foi inserida na organização como um Estado Observador, com a aprovação de 138 nações, nove votos contrários e 41 abstenções.

Por outro lado, a Cisjordânia é um território sem saída para a costa mediterrânea, que faz fronteira com a Jordânia e o Mar Morto, ao leste, e com Israel, ao sul, oeste e norte. A Cisjordânia constitui a maior porção da Palestina, perfazendo uma área de 5.860 km2 e contendo uma população de 3.176,549 habitantes. Gaza e Cisjordânia constituem a Palestina, sendo territórios separados com o Estado de Israel entre eles.   

Também aqui nos interessa a abordagem da ação terrorista concatenada pelo braço palestino armado, o Hamas, no último dia 7 de outubro, em pleno território israelense, causando a morte de cerca de 1.400 pessoas, mormente dos participantes de uma festa “rave”, que é um evento tradicional de música eletrônica ao gosto da juventude israelense, ocorrendo em locais afastados e a céu aberto.  Neste caso a “rave” era a Supernova Universo Paralello Edition, criada no Brasil há 23 anos e organizada pela primeira vez em Israel por Juarez Petrillo, pai do também DJ brasileiro Alok, Ela acontecia na região do kibutz Reim, próxima da Faixa de Gaza.

Não sou eu que venho aqui defender os atos terroristas praticados pelo Hamas, que no 7 de Outubro de 2023 invadiu o território de Israel matando, sequestrando e barbarizando, porém estou sintonizado com as declarações do português António Guterres, Secretário Geral da ONU/NATO – Organização das Nações Unidas –  que, ao mesmo tempo, condenou o terrorismo do Hamas, mas o justificou afirmando que “não aconteceram no vácuo”, ou seja não vieram do nada, concluindo que “o povo palestino tem sido sujeito a uma ocupação sufocante há 56 anos”. Melhor que eu traduza: desde a Guerra dos Seis Dias, em 1967, que o Estado de Israel, ocupou territórios árabes, nem todos devolvidos, oprimindo e violentando de modo particular o povo palestino. O Ocidente que ferozmente criticava o Muro de Berlim, se cala diante de outra vergonha que é o Muro da Cisjordânia, de mazelas semelhantes. O governo fascistóide de Netanyahu impõe permanente escalada de medo em Gaza e na Cisjordânia, através de seu poderoso exército e demais forças de segurança. Pior, patrocina a invasão de territórios palestinos por colonos judeus. Além do mais concluiu o Secretário-Geral da ONU: o povo palestino não deveria ser punido coletivamente pelos ataques do Hamas. Ou como satiriza o radialista muzambinhense Regis Policarpo: punem a esmo, porque os extremistas não se identificam com um símbolo de terrorista na testa.

O governo de Israel, através de seu Embaixador na ONU, Gilad Erdan, apelou para que Guterres se demita do Secretariado Geral da ONU, enquanto o Chanceler israelense Eli Cohen indiferente à desproporção dos ataques que devastam Gaza, que já matou muito mais palestinos do que judeus mortos, prometeu a continuidade dos bombardeios “pois é uma questão de sobrevivência para Israel”.  Sempre foi assim, diz este escriba: os mais fortes choram lágrimas de crocodilo. Sorte nossa que norte-americanos, israelenses e britânicos não mais são hegemônicos neste planeta. E aqueles que pensam que a Israel de hoje ainda é “um povo de Deus”, como foi a de outrora, não se esqueçam que aquilo foi a Antiga Aliança, ficou no Velho Testamento da Bíblia. O judaísmo não é cristianismo, não acreditam em Jesus como Filho de Deus e, ainda, esperam pelo Messias.

Como pode um povo que passou pelo Holocausto perpetrar a ignomínia e a desumanidade de tratar Gaza como um campo de concentração? De asfixiar e destroçar inocentes com bombas poderosas? Dos tempos remotos, da Antiguidade, a herança belicosa persiste em Israel.
                                    
 

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