Guaxupé, domingo, 28 de abril de 2024
Marco Regis de Almeida Lima
Marco Regis de Almeida Lima Antena Ligada Marco Regis de Almeida Lima é médico, nascido em Guaxupé, foi prefeito de Muzambinho (1989/92; 2005/08) e deputado estadual-MG (1995/98; 1999/2003). E-mail: marco.regis@hotmail.com

LEMBRANÇA COM SAUDADE DE VONZICO E COMPARANDO O SOBRENATURAL VIVIDO POR MIM E POR ELE

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022
LEMBRANÇA COM SAUDADE DE VONZICO E COMPARANDO O SOBRENATURAL  VIVIDO POR MIM E POR ELE O muzambinhense Ivon Waldete Vieira, conhecido como Vonzico, morreu em 13 de setembro de 2019, aos 93 anos (Foto: Terceiro Tempo Uol/Reprodução)

Neste feriado dos 142 anos de Muzambinho fiz algumas reflexões sobre personalidades que aqui viveram, não somente políticos que a governaram, porém sobre pessoas do próprio povo que à sua época conhecemos, convivemos ou dela ouvimos falar, as quais praticaram as mais diversas atividades neste município, contribuindo na sua edificação habitacional e histórica.

Me detive na figura do saudoso Vonzico, batizado como Ivon Waldete Vieira, que preferia assinar sua produção literária como Ivon W. Vieira. Seu pai foi conhecidíssimo taxista de nossa cidade, Waldomiro Vieira, casado com Noêmia Barbosa Vieira, sendo ela nome de rua no bairro Cohab. O casal congregava na Igreja Presbiteriana local, junto com os numerosos filhos, sendo que a família para cá migrou da vizinha Nova Resende na busca de oportunidades estudantis, mormente no decantado Colégio Estadual de Muzambinho. Vonzico ainda alcançou uma das antigas denominações desse pujante educandário: Ginásio Mineiro de Muzambinho, hoje a mais do que centenária Escola Estadual “Prof. Salatiel de Almeida”.  Para os mais jovens leitores da região, que não puderam conhecer essa importante família, que engrandeceu a cidade e região, mas cujos vínculos foram sendo perdidos pelas vicissitudes da Vida, dou como referência o recém falecido Dr. Ivonaldo Vieira – Nadinho – que aqui foi advogado da antiga Escola Agrotécnica Federal, hoje “campus” MZBinho, do Instituto Federal do Sul de Minas Gerais, dádivas dos Presidentes Getúlio Vargas e Luís Inácio Lula para o nosso Município, instituição vista com certa indiferença e ingratidão por setores políticos reacionários da nossa localidade. Nadinho foi grande futebolista local, ao lado do irmão que lhe sobrevive e reside em Poços de Caldas, Ivan Vieira, bem como bancário da agência local do extinto estatal mineiro, Banco de Crédito Real de Minas Gerais, e professor universitário de disciplina de Direito, da UNIFENAS, de Alfenas. QUIÇÁ, com a última referência que dou, desate eu a genealogia dos VIEIRA de MZB-MG, que possui hoje uma estrela na constelação da Rede Globo: ALEXANDRE NERO, filho de Iracema Peixoto e Ibrahim Nero Vieira, este, um dos irmãos mais velhos de VONZICO, genitor de Alexandre Nero, que viria a se formar Técnico Agrícola na citada Agrotécnica de MZBinho. Alexandre Nero se destacou em algumas novelas encarnando personagens como o feirante Vanderlei, apaixonado por Lília Cabral, na novela A Favorita (2008), ou do motorista Baltazar, casado com Drica Moraes, em Fina Estampa (2011), mas consagrando-se mesmo no papel do Comendador, com seus diamantes do Monte Roraima em Império (2014).

Pois bem, depois de 42 anos de residência na Capital paulista, Vonzico se aposentou, retornando para MZB no final de 1990, aqui ampliando sua capacidade de jornalista/escritor, assinando duas colunas do semanário local A Folha Regional: A Voz do Povo, na qual fazia veementes cobranças às autoridades municipais; e Histórias, “Causos” e “Estórias, que, antes foram contados nas páginas da Folha da Tarde, de São Paulo, depois transformadas num livro com o mesmo nome, editado por CLR Balieiro Editores, São Paulo, 2.000.

Então é por aí que se entrelaçam as histórias de Vonzico e a minha, rogando eu que prestem muita atenção em todas as datas.  A mim, ele concedeu a honra de prefaciar seu livro, em dezembro de 1998. A fim de fazê-lo, li a coletânea dos escritos dele contidas no projeto do livro. À página 23 está a história: Coisas do Além em Muzambinho?  Nela, ele começa dizendo-se “ter sido um incrédulo de ‘coisas do além’ e muitas vezes quase implorava para que algum sinal aparecesse em minha frente para que tivesse uma certeza de fatos sobrenaturais”. Continua Vonzico: “ALGO ACONTECEU COMIGO DIAS DESTES EM MZB. [...] Pretendia viajar para São Paulo naquele ônibus que sai às 6;15h e liguei meu relógio daqueles que marcam as horas com iluminação para que eu acordasse às 5:30h [...] quase sempre quando chove nossa eletricidade dá defeito, e foi o que aconteceu naquela noite. O relógio parou e ao acender de novo voltou para meia noite. Ficando eu na dúvida quando acordei, prontamente me coloquei de pé e saí às pressas (em direção à Rodoviária). [...] Quando cheguei na Avenida (Dr.Américo Luz) o relógio da Igreja Matriz marcava apenas 3:30h da madrugada e ia voltando com raiva para casa quando algo anormal e estranho apareceu à minha frente. Parecia que uma procissão saía de uma das ruas laterais da Igreja, uma multidão em fila, com roupas brancas, e com velas acesas na mão. Fiquei assustado quando comecei a reconhecer as pessoas que acompanhavam aquela procissão, ficando estático no chão sem poder me mover, embora tivesse vontade de sair dali correndo. [...] Pessoas falecidas da cidade, muitas minhas conhecidas, até familiares meus, contornaram todo aquele primeiro quarteirão que fica defronte a Igreja Matriz. [...] Aquela procissão, podemos dizer, macabra, sobrenatural, prosseguiu seu curso em direção ao Alto do Ângelo e presumi que ela havia começado no Cemitério e lá terminaria, pois não tive coragem de acompanhá-la”. Neste texto, que resumi ao máximo, Vonzico diz que conseguiu criar forças para num sussurro perguntar se aquilo era uma visão ou estava acontecendo de verdade? Uma voz quase que lamuriante lhe teria respondido: “É uma penitência que temos de fazer a cada oito anos e por casualidade você está aqui para nos ver”. Vonzico desistiu da viagem e durante o dia disse ter contado o caso para sua mulher, Terezinha de Almeida Vieira.

POIS BEM, em 1998, sob minha intensa atividade parlamentar de final de ano, na rápida leitura para elaborar o prefácio do livro Histórias, “Causos” e “Estórias”, me deparei com o mencionado capítulo. Fui transportado a uma situação semelhante quando da minha primeira candidatura a Prefeito de Muzambinho, em 1988. Claro que fiquei perplexo, mas eram fatos passados. Naquela época, havíamos fundado o PSB no município, Partido Socialista Brasileiro, em 13 de fevereiro de 1988. Concorreríamos às eleições municipais, naquele ano em 15 de novembro. Éramos em quatro, e dos fundadores do Partido, nos intitulávamos os pontos cardeais do PSB/MZB: Joaquim Alves, formado em Educação Física e coproprietário de um restaurante junto com o irmão Emilinho – O Rei da Bisteca; Dr. José Roberto Del Valle Gaspar, advogado; Prof. José Sales de Magalhães Filho, pré-candidato a Vice-Prefeito; e eu, Marco Regis, pré-candidato a Prefeito. Antecipando, vencemos as eleições.

O que interessa em relação ao sobrenatural de Vonzico está aqui. Os quatro “pontos cardeais” nos reuníamos com frequência. Nossas reuniões iam além da meia noite, em locais neutros e variáveis. Iámos em dois automóveis. Ao final das reuniões, Del Valle levava Joaquim para casa e eu deixava o Professor Zé Sales na dele, na Rua Capitão Heleodoro Mariano. Eu seguia por essa mesma rua em direção ao bairro Jardim Canaã, onde moro até hoje.

Havendo eu deixado o professor e atravessado a 1ª esquina, Rua Dick Prado, adentrei no quarteirão seguinte dessa rua bem plana. Foi então que me deparei com uma procissão que vinha em sentido contrário, em filas indianas dos dois lados da rua, que é bastante larga. Vi pessoas com velas acessas, passando com meu veículo equidistante entre as duas fileiras. Além de estar dirigindo um automóvel, nunca fui de prestar atenção a detalhes. Por isso, não reparei para fisionomia nem vestes dos penitentes, tão bem descritas no relato de Vonzico.

Por que isto não é invencionice minha? Porque, chegando à minha casa, acordei minha mulher, Adalete, com quem já era casado havia 15 anos e tínhamos filhos de 14, 12 e 10 anos de idade. Sem ter me sentido em nada assustado, pois acreditei serem católicos cumprindo alguma promessa, serem todos de carne e osso, demonstrei a ela minha estranheza com tal acontecimento, justamente àquela hora da madrugada. Dessa razão pintou leve dúvida em relação ao sobrenatural. Esta minha ficha somente veio a cair DEZ ANOS DEPOIS, na ocasião da leitura do pré-livro com fito prefacial.

Mais intrigante foi esta semana. Ao reler o Livro do Vonzico, neste feriado municipal muzambinhense, fiz as devidas interpretações e análises. Primeiro: meu cruzamento com a Procissão dos Mortos foi anterior à de Vonzico, pois, 1988. O livro dele foi editado no ano 2.000, porém escrevi o prefácio em 1998 e a história dele, acima destacada, diz: “algo aconteceu comigo dia destes”, dando a entender que fora evento recente para ele, talvez uns dois anos antes. Seria 1996? Aliás, ele se mudou de volta para Muzambinho em 1990, conforme a contracapa do seu livro, sendo a minha ocorrência na campanha eleitoral para prefeito, em 1988. Seria determinado e chocante se o encontro de Vonzico com a Procissão dos Mortos tivesse se dado em 1996, pois, lembram-se do escrito acima de que um membro da procissão lhe teria dito que “É uma penitencia que temos de fazer a cada oito anos”. Então, somemos 1988 + 8 = 1996.

Adalete, minha mulher, fidedigna testemunha do meu relato, numa noite de 1988, deixou em definitivo este plano existencial no último dia 11 de julho. Mas, muitas vezes, ela corroborou na propagação dos meus relatos misteriosos daquela noite.  Tendo sido minha leitura sobre a Procissão dos Mortos de Vonzico meio que dinâmica, por ocasião do prefácio, dez anos depois do que vivenciei, imaginei que a ocorrência dele tinha sido muito antiga e que eu havia me tornado outra testemunha de um acontecimento além dos conhecimentos da natureza. Entretanto, somente agora, confrontando datas, o relógio, e outros detalhes é que vim perceber que fui eu quem viu primeiro. Pena que nunca me sentei com Vonzico para confrontar fatos.       

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